Foto: Gabriel Lain/Divulgação
Ataques a professores não são casos isolados. Dirigente sindical e pesquisador em educação apontam cultura de ódio das redes sociais como um dos motores
Ato de campanha salarial organizado pelo Sindicato dos Servidores da Prefeitura de Caxias do Sul (Sindiserv) se transmutou em uma grande ação de solidariedade à professora de inglês da Escola Municipal João de Zorzi, vítima de violência em plena sala de aula, ao ser esfaqueada na terça-feira, 1º, no município da serra gaúcha por três estudantes adolescentes. A presidente do Sindiserv, Silvana Piroli, destacou que o foco principal acabou sendo um apelo a não violência nas escolas. Segundo ela, o “fato de ontem não é um fato isolado”.
A dirigente relata hostilidades em vários setores do serviço público. Para Silvana, também professora, em especial na educação há fortes ações para a desmoralização do trabalho dos professores.
“Há muitas fake news do tipo, ah, ideologia de gênero, ah, a escola civil militar é a melhor”, desabafa. Segundo a dirigente, parcela da sociedade radicalizada desrespeita o trabalho pedagógico e contamina todo um ambiente que deve ser de aprendizado.
“Não dá para só valorizar os professores na época de campanha ou no Dia do Professor. Nós precisamos reconhecer que esse é um trabalho importante e que a educação precisa partir das pessoas que se relacionam com as crianças e com esse estudante. A escola é o saber, é a convivência, é a cidadania, mas a família precisa também fazer a sua parte, estar juntos, participar da comunidade cidadã”, entende.
Hugo Monteiro Ferreira, pós-doutor em Estudos da Criança
Fotos: Andréa Avelar Duarte/Divulgação
Hugo Monteiro Ferreira é autor do best seller A Geração do Quarto (Editora Record), doutor em educação, pós-doutor em estudos da criança e líder do Grupo de Estudos da Transdisciplinaridade, da Infância e da Juventude (Getij).
Pesquisador na área de saúde emocional e mental de crianças, adolescentes e jovens, Ferreira diz que, apesar de estudos apontar aumento nos tipos de violência que ocorrem dentro da escola, não significa que seja a escola a causadora da violência.
Nos dias atuais, segundo ele, elementos como redes sociais digitais, discursos de ódio frequentes produzidos por pessoas populares “como, por exemplo, políticos”; dificuldades nas relações familiares, situações psicopatológicos, muitos adolescentes apresentam comportamentos violentos, sejam autodestrutivos ou heterodestrutivos.
“Esfaquear uma professora numa escola, em um grau de menor alcance, é uma forma de atacar a escola, este espaço que representa a sociedade como um todo. Atacar a professora é atacar uma representante social a qual traduz elementos sociais talvez estressores para esses adolescentes”, analisa o pesquisador.
Em síntese, Monteiro Ferreira declara “o ataque não é nem alheio e nem aleatório ao contexto desses jovens". Antes de uma condenação, ele entende que os adolescentes agressores precisam ser ouvidos atentamente. “Isto para que possamos entender as razões do ataque a docente. De toda maneira, é possível dizer que esses jovens atacantes são potencialmente vulneráveis e precisam de cuidado no sentido saber como eles pensam e sentem a vida”, conclui o especialista.
Entenda o ocorrido
Segundo a Brigada Militar, três estudante (dois meninos e uma menina) de 13, 14 e 15 anos, teriam quebrado câmeras de vigilância e, em seguida, agredido a professora com golpes de faca.
Conforme o vice-diretor da escola, Gabriel Boff, estudantes da turma deixaram a sala assustados e gritando e relataram que a professora foi atacada
Neste momento, ele abriu um dos portões. Os alunos saíram e buscaram ajuda em uma unidade de saúde próxima à escola.
A técnica em enfermagem Raquel Pereira, que trabalha na Unidade Básica de Saúde (UBS) Fátima Baixo, fez o primeiro atendimento à docente que estava consciente, mas sangrando muito.
A professora foi levada por uma unidade da Samu para um hospital. A vítima ficou estável, não corre risco de morte e teve alta nesta quarta-feira, 2.
O combate à violência nas escolas tem mobilizado ações norteadoras do governo federal e do Legislativo.
O Sistema Nacional de Acompanhamento e Combate à Violência nas Escolas (Snave), instituído por decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) tem promovido estudos e mapeamentos sobre ocorrências, sistematizado medidas de gestão, apoiado escolas com altos índices de violência e oferecido suporte psicossocial à comunidade escolar.
Além disso, o governo destinou R$ 150 milhões para reforçar rondas escolares e monitorar ameaças online. Paralelamente, o Senado analisa o Projeto de Lei nº 3.345/2024, que propõe treinamentos regulares para prevenir e responder a ataques violentos, capacitando professores, funcionários e estudantes por meio de cursos e simulações práticas. A proposta, alinhada ao Snave, busca fortalecer a segurança escolar e já recebeu parecer favorável na Comissão de Segurança Pública, aguardando análise na Comissão de Educação e Cultura.
Fonte: Extra Classe